Non Dormo Ancora

A OPCIONALIDADE DO ATENDIMENTO AO USUÁRIO SURDO 


Igor Mendes - 30 de novembro de 2023


Este texto se configura como um recorte/adaptação de um dos capítulos da minha monografia, o famigerado trabalho de conclusão de curso, produzido para minha formação enquanto bibliotecário, na tentativa de produzir argumentos substanciais, para declarar guerra a quem quer que fosse o responsável pela ausência de profissionais qualificados e fluentes na Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS), no ambiente biblioteca.


De acordo com o censo de 2010 realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE), 2,3 milhões de brasileiros possuem deficiência auditiva, deste montante 344,2 mil são surdos, e não conseguem ouvir de modo algum. O que nos leva à primeira limitação deste texto, pois mesmo que um número relativamente alto da população nacional seja deficiente auditiva (maior inclusive do que a população total de muitos municípios localizados no Brasil), a maior parte das pessoas com deficiência auditiva no país não falam libras. Esse apontamento é importante pois nos faz refletir sobre as diversas barreiras que uma pessoa com deficiência auditiva enfrenta, como é o caso da educação básica extremamente precária direcionada a esses indivíduos e sua marginalização, ou a ausência de profissionais competentes na educação de pessoas surdas. Se faz aqui necessário pois, embora a maioria de deficientes auditivos não se comunique através da libras, os poucos que se comunicam deveriam ser compreendidos por uma classe que não os busca compreender.


Para mim, em uma visão qualificada por terceiros como pessimista, sempre pendi a acreditar em duas principais hipóteses: pessoas incapazes de notar o potencial contributivo de uma pessoa surda na sociedade; e pessoas incapazes de se aprimorar, apenas o fazem em benefício próprio, sem se importar com o componente humano, por revés cravado no artigo 5° do Código de Ética e Deontologia do Bibliotecário brasileiro, em seus deveres, alínea A “preservar o cunho liberal e humanista de sua profissão, fundamentado na liberdade da investigação científica e na dignidade da pessoa humana” (CONSELHO FEDERAL DE BIBLIOTECONOMIA, 2018).


Meu ponto de partida foi o ponto de partida do profissional bibliotecário, sua formação, como previsto na Lei nº 9.674, de 25 de junho de 1998 que dispõe sobre o exercício da profissão de Bibliotecário e determina outras providências, traz em seu artigo 3°, Inciso um, o exercício privativo do profissional bibliotecário, “aos portadores de diploma de Bacharel em Biblioteconomia, expedido por instituições de ensino superior oficialmente reconhecidas, registradas nos órgãos competentes, de acordo com a legislação em vigor” (BRASIL, 1998).


Por isso foi realizado um levantamento no período de 05 de agosto de 2022 a 10 de agosto de 2022 nas grades curriculares dos cursos de Biblioteconomia disponíveis no país (esfera pública e privada; presencial e a distância). De acordo com o Conselho Regional de Biblioteconomia 8 (CRB 8), existem cinquenta e três cursos de biblioteconomia espalhados em território nacional.

Quadro 1 -  A presença da libras nos cursos de biblioteconomia do Brasil.

Fonte:  Igor Mendes, 2023.

Do montante dos cursos de biblioteconomia presentes em território nacional, fica demonstrado que vinte e dois possuem libras em seu currículo, entretanto, dezoito das grades curriculares, trazem a disciplina de maneira optativa, ou seja apenas quatro escolas de Biblioteconomia formam bibliotecários obrigatoriamente capacitados em oferecer atendimento para usuários que se comunicam através da língua brasileira de sinais. Ainda pode-se notar que catorze dos cursos de graduação bacharel em biblioteconomia não ofertam a disciplina de modo algum de acordo com os dados disponibilizados em seus sítios digitais. 


Ressalta-se que para a elaboração deste estudo foram considerados como sinônimos de grade curricular ao coletar os dados os termos: matriz curricular; disciplinas do curso; currículo do curso; currículo de disciplinas; e estrutura curricular. Para complemento foram levados em consideração dados coletados também em último caso na ausência de grades curriculares, os encontrados em projetos pedagógicos. Também é válido mencionar que não foram levados aos fatos quadros e horários semestrais, visto que podem ocorrer a oferta de disciplinas extraordinárias que ocorrem em ocasiões especificas. 


Ao que se refere a dados faltantes, foram constatados que dezesseis dos sítios digitais visitados não possuem informações seja por não possuir grade do curso no site; seja por falhas técnicas em que o currículo se encontrava fora do ar até o momento da elaboração dessa pesquisa; seja pela inexistência de informações sobre o próprio curso que podem indicar extinção do curso ou não atualização dos sítios. Para todos os efeitos dezesseis instituições foram desconsideradas na compilação e ilustração dos dados, ou seja foram excluídas como amostra de pesquisa. Vale ressaltar que para todos os efeitos foram coletados dados referentes aos cursos de bacharel em biblioteconomia, excluindo cursos de licenciatura na área.


Outro ponto de destaque é que todos os cursos que possuem o bacharelado em biblioteconomia em mais de um período (diurno e noturno, matutino e noturno) se enquadram na quantificação de Um curso, mesmo possuindo duas turmas.


É possível notar que 63,9% dos cursos oferecem libras em suas grades curriculares, porém ficou estabelecido que apenas 21,7% desses mesmos cursos ofertam a disciplina de maneira obrigatória, contra 78,3% que a oferecem de maneira optativa. 

NOTAS

Dados da pesquisa - A presença da libras nos cursos de biblioteconomia do Brasil.

REFERENCIAS

BRASIL. Lei nº 9.674, de 25 de junho de 1998 - Dispõe sobre o exercício da profissão de Bibliotecário e determina outras providências. Brasília, 1998.

CONSELHO FEDERAL DE BIBLIOTECONOMIA. Resolução CFB nº 207/2018 - Código de Ética e Deontologia do Bibliotecário brasileiro. Brasília, 2018.

CONSELHO REGIONAL DE BIBLIOTECONOMIA 8. Instituições que ofertam cursos de biblioteconomia no Brasil. Disponível em: https://crb8.org.br/instituicoes/.  Acesso em: 27 de maio de 2022.

INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Censo Demográfico 2010: Características gerais da população, religião e pessoas com deficiência. Censo demograf. Rio de Janeiro, 2010. Disponível em: https://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/periodicos/94/cd_2010_rel. Acesso em: 29 de maio de 2022.